Páginas

20/05/2011

Um Punhado de Gitanes - Serge Gainsbourg

Ele era bêbado, feio, machista, grosso, mal educado, arrogante, inconveniente - além de fumante imparável. Enfureceu grupos conservadores, irritou o Vaticano e arrumou briga com Bob Marley. Mas, no final das contas, todo mundo adorava Serge Gainsbourg.
Faz mais de  20 anos da morte do cantor, compositor, ator, diretor, escritor, marido de Jane Birkin, pai de Charlotte Gainsbourg e amante de Brigitte Bardot. Tinha 62 anos quando foi abatido por uma parada cardíaca. Está sendo relembrado em filme: "Gainsbourg - O Homem Que Amava As Mulheres", cinebiografia dirigida por Joann Sfar que estreou fazendo barulho na França. Em livro, em edição brasileira, há a correta bio "Serge Gainsbourg - Um Punhado de Gitanes", de Sylvie Simmons, da editora Barracuda.

Não há ninguém acima de Gainsbourg na música francesa. Nomes contemporâneos, como Air e Phoenix, não se cansam de exibir sua paixão pelo bardo.

Mas afirmar apenas que Gainsbourg está no topo da música popular francesa não é suficiente para dimensionar sua relação com a cultura e o modo de vida de seu país. Hoje, é um tesouro nacional. Por meio de músicas como a deliciosamente erótica "Je t'aime ... Moi non plus" e invariavelmente com um Gitanes entre os dedos, Gainsbourg construiu um mito em torno de si. Não à toa, Jane Birkin, mulher que o acompanhou por 12 anos, sentenciou: "Ele achava que deveria fazer jus ao personagem que havia criado. Ele ia a um bar ou a um nightclub e alguém imediatamente lhe oferecia um drinque e ele então pagava um drinque para todo mudo. Ele foi morto pela própria imagem que criou".

Queria ser pintor, mas achava que não tinha talento - voltou-se, então, para a música. Fã de Cole Porter e George Gershwin, incorporou em suas canções a força melódica dos dois. Mas não se prendeu a um estilo. Nos anos 1960, olhou para o Reino Unido e avistou os Beatles e os Rolling Stones. Ajustou a chanson para a urgência do rock.

Em 1971, fez "Histoire de Melody Nelson", um disco em torno de um homem (Gainsbourg) que se encanta por uma adolescente que, no final, morre em um acidente de avião. Um álbum conceitual de menos de 30 minutos de duração, mas que até hoje faz sombra sobre músicos como Daft Punk, Bjork, Pulp, Beck.

Polêmicas sempre estiveram ao lado do ídolo. Chegou a produzir uma versão da Marselhesa em ritmo de reggae, gravada na Jamaica em 1978 - o jornal "Le Figaro" considerou uma heresia com o hino e liderou uma campanha para que Gainsbourg fosse defenestrado da França. Bob Marley também não ficou nada feliz com a temporada jamaicana do francês - acusou Gainsbourg de ter colocado sua mulher, Rita, para cantar letras "eróticas demais".

Gainsbourg só é Gainsbourg por causa das mulheres. Nos anos 1960, muitos não acreditaram que aquele beberrão narigudo tivesse conquistado uma das mulheres mais desejadas do mundo: Brigitte Bardot. Com ela, fez o obrigatório álbum "Bonnie & Clyde". Para ela, compôs "Je t'aime... Moi Non Plus". Mas Bardot se recusou a cantá-la - acreditava (com certa razão...) que seu marido iria ficar furioso com o conteúdo lascivo da faixa.
Quem cantou "Je t'aime..." foi Jane Birkin. Gainsbourg conheceu a atriz inglesa no set de um filme - ele quase duas décadas mais velho do que ela. Casaram-se, e a música foi lançada em 1969. É tão sexualmente sugestiva que alguns afirmaram que Gainsbourg e Birkin a gravaram enquanto transavam. Birkin respondeu que se eles estivessem transando, não teriam feito uma música, mas um disco. "Je t'aime..." foi banida de várias rádios (inclusive da BBC britânica) e enfureceu até o Vaticano, que excomungou o funcionário que tocou a faixa em uma emissora italiana.
Gainsbourg e Birkin se separaram em 1980. A carreira dele degringolou. Gainsbourg se tornou figura presente em programas duvidosos da TV francesa. Quase sempre, estava bêbado, falava besteiras e tirava sarro de quem estivesse ao seu lado.
A decadência artística e a caricatura na qual se transformou do final dos anos 1970 em diante nada importam. François Miterrand, presidente da França entre 1981 e 1995, declarou logo após a morte do cantor: "Ele foi nosso Baudelaire".



Nenhum comentário:

Postar um comentário